Na hierarquia das nossas relações, existem aquelas pessoas que conhecemos (antigos amigos, por exemplo) com quem trocamos informações básicas sobre a vida quotidiana de quatro em quatro meses ou de seis em seis meses. De ano a ano talvez se combine um café (detesto esta expressão, a propósito). São aquelas pessoas que não sabem muito bem o que andamos a fazer da vida nem nós sabemos da vida delas - e o que sabemos sobre a vida delas sabemo-lo com um atraso de seis meses - e em que tudo vai bem porque ninguém tem muito interesse nisso excepto de cinco em cinco meses por uma questão de rotina e alguma curiosidade.
Depois há as pessoas mais próximas com quem trocamos mais informações sobre a vida e acontecimentos quotidianos em ciclos mais regulares de tempo: de semana a semana, de três em três dias, de quinze em quinze dias no máximo. Em alturas com muita coisa para fazer, no limite, de mês a mês. Essas pessoas normalmente sabem como vai a nossa vida quotidiana: se partimos uma perna, se estamos a trabalhar, se mudámos de casa, se morreu alguém, se já começámos as aulas. Algumas até sabem de vez em quando se temos umas calças novas. Nós também sabemos essas coisas sobre elas.
E tudo vai bem assim porque estamo-nos todos a cagar uns para os outros e mantemos as nossas rotinas - e isto é bestial. Isto é, as nossas relações são desinteressadas in a positive way. Espontâneas: fazemos o que nos apetece quando nos apetece e fazemos o que sentimos de um modo geral.
Mas algo de mesquinho e abjecto ocorre, nesta segunda categoria de pessoas, quando esta rotina é quebrada e a segunda categoria de pessoas opta por um voto de silêncio drástico e forçado, de um dia para o outro, sem mais nem menos. Forçado, não espontâneo, premeditado, com interesses específicos. Algum ressentimento pela felicidade e bem-aventurança do outro. Sim, mesmo numa situação em que a outra pessoa vai viver para outro país, por exemplo. As perguntas de rotina - mesmo as mais básicas - deixam de existir: se a viagem correu bem, se o avião não caiu, se está tudo bem, estás a gostar de aí estar, etc.
Isto vai para além da má educação, claro. Há maldade nisto. Mentalmente já colocámos essas pessoas naquela primeira categoria de que falei.
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2 comentários:
"granda" tiro.
Grande poder analítico, hierarquias e não sei quê, sim senhores.
E eis que, chegando ao 4º parágrafo, tudo cai. É assim, digamos que, o "twist" do filme (é assim, não é? Ou é "twister"? "hipster"?, "hamster"?), catrapum de escadas a baixo, mete medo até.
E quem te diz que as pessoas recém chegadas à segunda categoria não se transmutaram de forma "espontânea"? Não sabes se morreram, se estão em coma, se ficaram mudas, se mudaram a cabeça, se estão num retiro budista, não sabes. Quem te diz? Dizes tu para ti, ora pois.
Quem te diz? Faz um post sobre a intuição. ou nãão.
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